Azul


Corações batendo em todos os lugares. Muitos deles pareciam pequenas estocadas de uma agulha afiada e indolor. Principalmente em um determinado ponto dos joelhos - com atenção maior ao direito, que sempre pulsava por mais tempo.

Não sabia bem o itinerário dos dedos, se traçariam círculos perfeitos ou apenas movimentos repetitivos para cima e para baixo.
Às vezes gostava de deitar de bruços, simulando com a pelve o movimento conhecido. Ou então a cabeça deitada confortavelmente no travesseiro, como nessa noite. As mãos apertando com força os seios, que nessas horas, misteriosamente, não sentem dor alguma.
A cabeça jogada pra trás, o suspiro afogado de quem divide casa mesmo depois dos 30, o barulho contínuo do ventilador de teto.

Dedo do meio e indicador levemente úmidos de saliva, ação que só permitia consigo mesma e que achava uma falta de dedicação extrema quando feita durante o sexo. Enfiava rapidamente a mão na boca, inclusive os dedos que ficam de fora, deixando-os úmidos na medida certa. Nem baba demais, nem seco de menos. Nem diria ideal. Mas o suficiente pra penetrar a entrada, trazendo consigo a umidade escondida.

Não há nada no mundo melhor do que se deitar consigo mesma, ela pensava. Ou, se não pensava, poderia muito bem pensar, já que é uma das verdades absolutas desse mundo. Talvez a única, pensando bem.

Contorcendo-se na cama, o corpo tenso, os dedos dos pés que às vezes se abraçavam e estralavam para atestar a realidade do gesto, as pernas entreabertas e de repente uma pausa. Ela gostava disso. Parar no meio do caminho, imaginar o movimento dos átrios e ventrículos, sentir o sangue correr quente, enchendo seu corpo de manchas vermelhas arredondadas e deixando suas bochechas meio inchadas e igualmente vermelhas.
Continuava. O corpo como terra quente e molhada afofado por mãos cheias de sede, querendo sentir raízes, pedregulhos, insetos microscópicos.

Prova-se da terra. Há sujeira no gesto, claramente. Um gosto de ferro que escorre pelos lábios, uma vontade de mergulhar com a própria boca nesse amontoado de si mesma, devastar montes, puxar folha a folha da árvore que, mal crescera, escorre pelo tronco o sumo grosso de seus frutos. 

Mar agitado. Medo da solidão. Corações batendo por trás dos olhos. Expandir e cessar de costelas. Ar saindo rápido pelas narinas e pela boca. A calcinha presa apenas por uma das pernas. Ressaca.

Um cheiro forte e familiar nas mãos.


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