(Agora eu sei)

Eu não sei brincar de amor
                                                               
Hoje, enquanto tomava banho, me peguei pensando no fato de que a vida inteira eu só me envolvi com pessoas erradas. Mas daí me veio uma outra coisa em mente: Eu sou a mais errada de todas elas. Eu sou. Eu não sei fazer carinho sem pedir carinho em troca. Eu não sei brincar de amor. 

(algum dia, de algum mês, de 2007) 



Escuta, ainda não acabou

Escuta aqui, presta atenção só mais uma vez. Só por um segundo. Lembra? Eu te disse aquilo aquela noite mas de repente aquilo não faz mais sentido do lado de dentro. Você me apertava com força e eu tive medo dos seus olhos. Eu sabia que você não iria me bater ou acordar o prédio todo com os gritos de uma briga, mas eu tive um medo tão grande! Um medo do olhar. O amor acaba quando você não consegue mais se ver dentro do olhar do outro. E eu me via ainda, eu estava lá, quieta e assustada. E tive medo por isso. Medo dos seus olhos tão verdes e tão profundos, esses olhos que eu sempre me perco quando quero me encontrar nas estradas em que você insiste em desenhar com seus dedos queimados de cigarro. Você não lembra. O relógio rodou por aí. Por aqui o tempo ainda congela feito um relógio de cordas quebradas e eu já não posso mais ouvir o badalar do teu nome. Enxergo teu corpo no corpo de todos os cem homens de todos os cem corredores. Eu quero tanto te dizer, meu amor.
Vê que ainda te chamo de meu amor. Não posso mais.
Por favor, só me ouça pela última vez. Não quero tua boca, muito menos sentir sem corpo rijo contra minhas coxas já quentes. Não quero mais, você entendeu?
Quero tanto.
Não me segure nunca mais pelo braço daquele jeito. Eu não quero sair dos seus olhos, eu não quero me perder dos teus pêlos.
Não deixe, simplesmente não deixe.
Arranque o cigarro das mãos, cale a boca do Dylan, deixe o café esfriando, mas venha.
Eu te espero tanto, meu amor.
Te espero fria, burra. Me visto da mulher mais burra do mundo pra você. É isso que você quer? Um foda bem dada, uma carta de amor? Eu dou, eu faço. Eu gemo se você preferir, apesar de eu não gostar. Imito Vinicius, fodo com outra, me toco pra você ver.
Você me ouve?
O amor é a burrice que o coração inventa quando sente que está preparado pra sofrer, você me disse uma vez. E quem sofre agora, meu amor?
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------
A propósito, você parou de fumar? Sim, minha mãe vai bem, meu irmão também. Perguntou de você ontem. Eu te amo. Prestatenção nisso: Eu te amo. Não desvia o olhar. Não desvia a porra do olhar.
Me olha. O que você quer que eu faça? Eu grito. É isso que você quer que eu faça? Conte pra todo mundo que eu sou mais uma dessas garotinhas burras que se apaixonam, se casam e depois passam a vida toda apanhando na cara de marido filho-de-uma-puta e. Gostam. Eu não quero ser essa mulher. Eu sei, eu sei que você nunca me bateu. Mas é que. É como se fosse, entende? Você me machucou aqui. Tá vendo? Bem aqui.
Apaga essa merda de cigarro. Eu não tenho nenhum cd do Dylan aqui.
Me olha.
Me toca.
Me ame, meu amor.
Espera, não vai embora ainda. Eu vou passar o café. Tem capuccino também. Comprei aquele que você gosta. Espera mais um pouco. É que eu não consigo dizer.
-------------------------------------------------------------------------------------------------------------
 Lembra aquele dia em que eu disse que eu não te amava mais?
Eu menti. 

Das palavras cruas

(Para se ler ao som do silêncio)

Isso era pra ser um conto. Eu, egocêntrica que sou, personagem principal. Acontece que não sei brincar de me ficcionar. Sou pura autobiografia. 
Tive tanta saudade da palavra. Assim: de repente. Uma saudade do verso, da prosa, do cansaço que bate no corpo depois de terminar uma história cheia de quereres.

Tenho vontade de me reescrever.
Do alto dos meus 20 anos, de repente tive medo de me perder de mim. Me errar por dentro como se erra o desfecho de um conto (os finais sempre nascem por si só). Eu me nasço. Mas tenho morrido tanto.
Quero escrever, porra.
E a vida não deixa. O tempo gira rápido, dia, tarde, noite. Acabou. Cama, sono. Um livro caído no peito e nenhum verso no caderno-rosa-ainda-vazio. 
Eu quero escrever e sinto uma angústia gigante por não conseguir. Por não ter esse tempo de respiro - de suspiro. Minha angústia é palavra enganchada do lado de dentro, presa nas amígdalas, perdida entre os cabelos. 
Escrever é uma grande maldição. Às vezes me pego pensando que o fato de eu ser assim - tão desassossegada, tão presa dentro de uma música do Radiohead - tem a palavra como principal culpada. A palavra lida, que percorre todos os órgãos e cai de leve no coração em forma de pulsão. Pulsão de escrita.
Eu quero escrever. 
Escrever que tenho pena dos casais que dividem mesas de restaurantes sem trocar nenhuma palavra, dos homens que nunca sentirão o gosto doce do amor-sexo bem feito...
Eu quero escrever sobre um monte de coisas a toda hora. Mas só consigo ficar num mesmo e maldito assunto. Meu eu em você. Ou como todos os romances do mundo ficam sem graça e todas as palavras do mundo não fazem sentido quando tudo o que tenho é seu corpo colado ao meu e tua palavra crua colada à minha desordem. O resto se resume apenas em livros na estante e roupas jogadas em volta da cama. 
Não quero saber da palavra que não seja sentimento-carne. 
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...