Crônica de uma vida anunciada

Vendo-a assim, dentro do marco idílico da janela, não quis acreditar que aquela mulher fosse quem eu pensava, porque me recusava a admitir que a vida acabasse por se parecer tanto à má literatura. (García Márquez  em Crônica de uma morte anunciada – p. 131)

A grande verdade é que viver é um saco. Estou no ápice do meu inferno astral e, principalmente nessa época, queria não acreditar em astrologia. Mas acredito. E parece que quanto mais se acredita mas ele bate. Bateu por aqui. Mas já havia batido antes, bem antes da fatídica faixa da desgraça emocional do mês antes do aniversário. 
É engraçado fazer um flashback do que eu quis ser em vários períodos da minha vida. Já quis ser astronauta quando era criança, arquiteta na pré adolescência, psicóloga na adolescência e quando a enxurrada de hormônios deu um tempo, soube que eu ia querer escrever pelo resto da minha vida. Calhou então de fazer jornalismo e as Letras vieram quase que por acaso. Hoje, na noite anterior à entrega de um dos tão almejados canudos que anunciam o começo do fim das barras da saia de mãe, não sinto a mínima vontade hollywoodiana de jogar o capelo, aquele chapéu bizarro, pra cima. Não existe câmera lenta e provavelmente nem existirá um discurso bonito. Só longas horas de uma espera que foi tão grande mas que quando chegou não sei bem o que quer dizer. Querendo ser Truman Capote mas sendo o Dan de Closer, escrevendo obituários. Ou nem isso.
A verdade é que viver dói pra caralho. E o uso do palavrão é útil porque parece fazer sossegar um pouco o coração que anda afoito pra comer o mundo. Não sei onde colocar as mãos, preciso de um cigarro na mão esquerda e de alguém pra segurar a mão direita. Leio sites inúteis, brinco com o gato, choro vendo filmes, nenhum livro parece ser o suficiente. Vivo apesar de. E eu, defensora maior desse "apesar de" que sempre me empurra pra frente e me faz conseguir enxergar o doce no amargo, tenho me contentado dia a dia com um ranço que nunca me pertenceu. Inquieta, burra, personagem secundário de um livro ruim. Só não uso o adjetivo "infeliz" pra não parecer drástica demais, perdida nesse universo de realidade e drama. Mas sim, talvez infeliz. Insatisfação pura, sem gelo. Bebendo em tragos rápidos, pra não sentir demais o que desce raspando goela abaixo.
O nó na garganta, que antes se resumia a amores mal vividos, agora se resume a uma crônica de uma vida anunciada que não está parecendo nada amigável. 
Não existe amor em SP, meus caros. A má notícia é: nem em nenhum outro lugar.

Um comentário

  1. em estas épocas é um pouco difícil compreender a cartografia nas paredes das nossas almas, principalmente quando pensavámos que eram brancas.
    sonhar para onde vai o trilho do trêm
    ver que sempre chega a lugares já conhecidos, desbravados, e, nos dias de hoje, completamente urbanizados/civilizados. que nem a Taina, daquele filme, sabe? gostaria de viver.

    mas não sei, buscar a selva também torna-se um pouco inutil.
    como é inútil ter um canudo nas mãos, quando a mesma mão já sabia escrever tão bem os sentimentos ínfindos do peito, antes de passar anos estudando as respectivas faculdades.

    só tenho três coisas para declarar:
    parabenizo pelos canudos (recordando também que o Cajuzinho largaria isto por um amor exagerado).

    continue tragando os goles de tudo o que vier pela frente, viver não dói. Arde. e apesar de.

    "eu sou o lugar onde estou".

    um beijo, e aqui também não existe o amor.

    ResponderExcluir

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...