Carta para Vinicius

Hoje é centenário do Vinicius, meu poeta preferido bem antes de eu saber direito o que é ser um poeta. Achei aqui uma carta de 2008, quando eu tinha 18 anos e era mais piegas do que eu sou hoje. Me cocei pra mudar algumas coisas no texto, mas deixei tudo exatamente como estava. O fato é que a carta foi escrita para o Vinicius depois de um sonho que eu tive com ele - um dos mais reais da vida toda. Sua bênção, Vinicius! Saravá!

Vinicius de Moraes, poeta de coração puro e de tristezinha funda cravada no fundo d’alma, venho por meio desta tentar te dizer algumas coisas que tô pra te dizer faz um tempão, desconfio até que é um tempo pra lá da minha idade. Mas antes, queria contar do meu sonho.
Sonhei com você essa noite. Foi sonho curto, como deveria ser. Mas foi de uma beleza viniciana exata e palpável. Tocava Medo de amar ao fundo e, de tão lindo que estava, eu chorei. Não sei se chorei por ser aquela coisa tão sensível de virar a folha do livro e esquecer de alguém ou se por serem palavras construídas da sua boca e do seu corpo todo, o que é a matéria-prima da sua poesia. Desconfio que era por ser o seu medo de amar. Eis que, de repente, não mais que de repente, você aparece do meu lado, com os seus 60 e poucos anos, e aqueles olhos tristes junto com um sorriso doce e pergunta – Isso é meu?
- É seu.
Eu respondi chorando e nem sei separar exatamente o que aconteceu, mas só sei que quando dei por mim estava no seu abraço. E te abraçava sôfrega e alegremente. Você é uma coisa de louco, Vinicius. Como não podia deixar de ser. Seu amor nada líquido rompeu com os limites do corpo, do céu e do pensamento e veio parar bem no meu medo de amar. E eu chorava. Chorava muito! E te dizia o quanto eu gostava de você, o quanto você me sentia e eu te sentia de volta. Você é meu amigo, Vininha. O pai que eu não tive me contando histórias de amor ao pé do ouvido. E você nem falou nada, acho que deve ter ficado tímido... Não esperava essa atitude tão tátil e apaixonante de mim? Me desculpe. Não foi a intenção. É que não me contive. Você tem uns olhos... E o sorriso? É tudo o dualismo perfeito do que não era pra estar junto. E ah, Vinicius, eu gostei tanto de te abraçar. Na verdade, vou ser sincera... eu posso ser sincera, não é? A gente é quase que parente. Podemos fingir que somos. Mas na verdade isso não quer dizer nada. Mas a gente pode fingir que quer dizer só pra ficar mais visível a nossa irmandade de coração. Vou ser sincera então. Eu tive vergonha em uma horinha, mas, me desculpe, não vou poder te contar qual é, porque se tive vergonha em sonho, não é agora em carta que eu vou contar, né? Mas é só pra dizer. É que essa coisa de fraterna que vive em nós não pode perder o encanto nunca nessa vida. E não vai, porque vive em mim desde quando eu era parte da Valsa para uma menininha até quando eu fui a menina com uma flor. Eu cresci com você, Vinicius. Cresci por fora, mas, principalmente, por dentro. Você fez nascer em mim a flor amarguinha da poesia. Se eu vejo tristeza no feliz e felicidade no triste é tudo culpa sua e da bossa e do amor e dessa coisa que me brota no peito e que não tem nome. Ah, Vininha, meu poetinha do tamanho do céu, maior que o mundo todo, eu te abraçava tão forte... E, chorando, vendo só a sua nuca com aqueles fios de cabelos brancos querendo enrolar e um cheiro de areia e sal, eu disse:
- Eu queria tanto ter vivido no seu tempo.
E você de novo não disse nada. Mas não foi por mal. Eu aposto que você devia estar sorrindo, vendo só meu cabelo comprido cheirando doce. Você estava.
E daí eu só queria te dizer, assim, rapidinho, pra você não perder o seu tempo eterno, que ainda é pouco pra quem vive muito, que eu amo você. De um jeito assim, bonito e ingênuo. Mas eu te amo.
E queria ter vivido no seu tempo.
Obrigada por ter vindo me visitar no meu.



De dentro do coração, 

Layse Moraes 

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